1. Uma das maiores riquezas do Sermão da Montanha está na simplicidade infantil de sua linguagem. Qualquer criança, qualquer adulto, por ignorante que seja, pode compreendê-lo, desde que o possa ler. Não há nele uma só palavra que requeira o uso de um dicionário; não há uma só sentença que não indique o caminho de maneira tão evidente, que "os caminhantes, até mesmo os loucos, não errarão" (Isaías 35:8). E, entretanto, o Nazareno foi a mais plena, a mais completa manifestação da Mente una que jamais viveu; isto é, manifestou-se, em visibilidade, mais daquela sabedoria, que é Deus, através d'Ele, do que através de qualquer outra pessoa que tenha existido. Quanto mais uma pessoa manifesta a verdadeira sabedoria, que é Deus, tanto mais simples são os seus modos de pensar e agir, tanto mais simples as palavras pelas quais expressa as suas ideias. Quanto maior a verdade a ser expressa, tanto mais simplesmente pode (e deve ela) ser enunciada.
2. Disse Emerson: "Se conversarem com uma mente grandiosamente simples, toda a literatura lhes parecerá um mero jogo de palavras."
3. Na literatura metafísica de hoje, empregam-se inúmeros termos que causam muita confusão àqueles que não tiveram um curso sistemático de lições sobre o assunto. Parece-me, portanto, conveniente dar aqui uma explicação clara e simples de duas palavras frequentemente empregadas, de sorte que até mesmo os mais incultos possam ter uma compreensão mais clara de suas leituras.
4. As palavras "personalidade" e "individualidade" têm significados distintos para a mente adestrada, porém são frequentemente empregadas uma pela outra por uma mente menos preparada, e tomadas amiúde num sentido afastado do seu significado real.
5. A palavra "personalidade" refere-se à parte humana de seu ser — à pessoa, ao exterior. Pertence à região governada pelo intelecto. Sua personalidade pode ser agradável ou desagradável aos outros. Quando você diz que não gosta de alguém, você quer dizer que não gosta de sua personalidade — daquele algo exterior que se apresenta do lado de fora. É o homem exterior, mutável, em oposição ao homem interior, real.
6. "Individualidade" é o termo empregado para designar o homem real. Quanto mais Deus Se manifesta em visibilidade por meio de uma pessoa, tanto mais individualizada se torna ela. Não quero dizer com isso que a individualidade de uma pessoa seja maior quando ela é mais religiosa. Lembre-se de que Deus é sabedoria, inteligência, amor, poder. Quanto mais acentuada a maneira pela qual qualquer uma dessas qualidades — ou todas elas — se tornam manifestas em visibilidade, por meio de um homem, tanto maior a individualidade deste homem.
7. Emerson era um homem de grande individualidade, mas de personalidade apagada. Era ele grandiosamente simples. Era de natureza (ou personalidade) retraída, reservada, mas na proporção exata em que o seu lado humano estava disposto a apagar-se e a passar despercebido, a sua parte imortal, Deus nele, brilhava em grau mais elevado.
8. João Batista representa o intelecto iluminado, o mais alto desenvolvimento da consciência humana. Podemos considerá-lo como representando a personalidade, ao passo que Jesus simboliza o aspecto divino, ou individualidade. Reconhecendo a superioridade de Jesus, João Batista disse: "É necessário que ele cresça e que eu diminua" (João 3:30).
9. A individualidade de uma pessoa é aquela parte cuja identidade nunca muda. É Deus nela. É o que distingue uma pessoa de outra. A personalidade de uma pessoa pode tornar-se semelhante à de outra a quem se associe. A individualidade não muda nunca.
10. Não confunda esses termos. Uma pessoa pode ter uma personalidade, um "homem exterior", agressivo, pronunciado, que poderá, durante algum tempo, abrir caminho através dos obstáculos e conseguir o seu fim. Mas uma individualidade pronunciada nunca combate; nunca se ensoberbece; nunca é governada por simpatias ou antipatias, nem as desperta nos outros; é Deus manifestado em grau mais elevado através de um homem, e toda mera personalidade dobra, instintivamente, os joelhos diante dela, em reconhecimento à sua superioridade.
11. Cultivamos a individualidade, escutando "uma voz dum suave silêncio" (Reis I 19:12) que fala no íntimo de nossa alma, e obedecendo-lhe destemidamente, embora com isso nos tornemos diferentes dos outros, como certamente ocorrerá. Nós cultivamos a personalidade, na qual vive o orgulho, o medo da crítica e toda a sorte de atitudes egoístas, dando ouvidos a vozes exteriores e deixando-nos reger por motivos egoístas, e não pelos mais nobres, existentes em nosso íntimo. Procure sempre cultivar, ou tornar manifesta em visibilidade, a individualidade e não a personalidade. Na medida em que uma crescer, é necessário que a outra diminua.
12. Sempre que receamos alguém, ou procuramos evitá-lo, é porque sua personalidade domina a nossa, por ser a mais forte. Muitas pessoas tímidas vão pela vida afora julgando que são ineficazes, que outros têm mais entendimento, ou são melhores do que elas. Receiam deparar-se com uma criatura positiva, controlada; e quando se encontram na presença de uma pessoa dessas, abatem-se, assim como um trigal varrido por um forte vendaval. Sentem-se como se desejassem desaparecer para sempre.
13. Tudo isto ocorre, tímido amigo, não por ser aquela pessoa verdadeiramente mais talentosa ou melhor do que você mas porque a personalidade dela — o homem exterior — é mais forte do que a sua. Você nunca experimentará sensação semelhante na presença de uma individualidade forte. A individualidade em outra pessoa não só provoca em você admiração pela superioridade dela, mas também lhe dá, quando está junto a ela, uma estranha e nova percepção de suas próprias possibilidades inerentes, uma sensação que o enche de regozijo, conforto e encorajamento. Isto se dá porque uma individualidade pronunciada significa, simplesmente, que maior porção de Deus Se manifesta em visibilidade por meio dessa pessoa e, por algum processo mental, tem o poder de fazer que uma maior porção de Deus Se manifeste em você.
14. Se quiser saber como evitar que a forte personalidade de outros o domine e vença, eu lhe diria o seguinte:
15. Lembre-se sempre de que a personalidade pertence ao humano e a individualidade procede de Deus. Afirme silenciosamente sua própria individualidade, sua unidade com Deus e sua superioridade sobre a personalidade. Pode Deus recear alguma pessoa?
16. Se for naturalmente propenso à timidez ou ao retraimento, a prática dos seguintes conselhos ajudá-lo-á a dominar tais tendências. Quando caminhar pela rua e vir alguém chegando em sua direção, embora seja um estranho, afirme, silenciosamente, palavras tais como: "Sou parte de Deus tornado visível; sou uno com o Pai; esta pessoa não tem poder sobre mim, pois sou superior a qualquer personalidade". Cultive esse hábito de pensar e afirmar, sempre que se aproximar de alguém, e descobrirá logo que nenhuma personalidade, por mais forte e agressiva que seja, tem o poder de privá-lo do mais perfeito equilíbrio íntimo. Você possuirá a si mesmo, porque Deus o possui.
17. Há alguns anos, senti-me dominada por uma personalidade forte e agressiva, com a qual estivera, externamente, associada com bastante intimidade durante alguns meses. Parecia-me que estivesse a ver tudo pelos olhos da outra pessoa e, embora eu tivesse bastante consciência disso, não conseguia libertar-me. Essa personalidade podia, com pouquíssimas palavras, fazer com que eu julgasse que tudo quanto fazia ou dizia estava errado, e que eu representava o mais miserável fracasso. Sentia-me, sempre, profundamente desanimada depois de haver estado na presença dessa pessoa, e parecia-me que seria incapaz de levar coisa alguma a cabo.
18. Após ter debalde tentado, durante semanas, reconquistar a minha liberdade, estava eu certo dia andando por uma rua, com o mais intenso desejo e determinação de me libertar. Muitas vezes antes, eu havia afirmado que aquela personalidade não podia me afetar nem dominar, mas sem resultado. Naquele dia, fui mais longe e declarei (em silêncio, naturalmente), "Não existe personalidade em todo o universo", e afirmei-o e tornei a afirmá-lo vezes seguidas. Passados alguns momentos, comecei a sentir-me maravilhosamente animada, como se grilhões estivessem soltando-se de mim. Então, a voz interior concitou-me a dar um passo adiante e dizer: "Não há personalidade no universo; nada há senão Deus". Depois de haver passado pequeno intervalo de tempo a empregar vigorosamente essas palavras, pareceu-me estarem todas as cadeias partindo-se. A Partir daquele dia e até agora, sem fazer mais esforço, tenho estado tão livre da influência daquela personalidade como se tal influência nunca houvera existido.
19. Se, em qualquer ocasião, uma afirmação menos enérgica da Verdade for incapaz de libertá-lo da influência de outras mentes, experimente está, que é mais radical: "Não há personalidade no universo; não há nada, senão Deus" e, logo, você se tornará livre.
20. Quanto mais você aprender a agir de acordo com a "voz dum suave silêncio" que fala em seu íntimo, tanto mais forte e pronunciada será a sua individualidade.
21. Se tiver tendência ao desânimo diante de personalidades fortes, lembre-se de que Deus tem necessidade de você a fim de manifestar-Se, de algum modo especial, através de você — modo este para o qual Ele não pode empregar nenhuma outra pessoa. Assim sendo, que razão tem para sentir-se inferior diante de quem quer que seja, por muito importante que seja?
22. Por humilde que seja o seu lugar na vida, por desconhecido que seja no mundo, por mesquinhas que lhe possam parecer atualmente as suas aptidões, você é tão necessário a Deus, em Seus esforços para manifestar-Se em visibilidade, quanto o possa ser o intelecto mais brilhante, a pessoa mais culta do mundo. Lembre-se sempre disso e aja de acordo com o que de mais elevado existir em seu íntimo.
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